domingo, 12 de junho de 2011

CIDADE PLANADOR



ATENÇÃO! ATENÇÃO! Depois de um longo tempo, cá volto pra mais uma série de pataquadas a esmo. Atendendo a pedidos calorosos de meus pais e pra desespero do restante da minha lista de endereços, volto a este espaço pra pouco dizer, confundir um cadinho mais e em lugar nenhum chegar. Alô! Alô! Lúcio Costa... onde fica o trem de pouso dessa joça?

Pois bem, estava com saudades de poder me dar esse prazer de voltar a escrever bobagens. Depois que sai do Acre vivenciei tanta coisa nova ao mesmo tempo e em tão pouco tempo que não tive como passar por aqui. Aliás, ao que parece, não é só na minha vida não. Já perceberam como esse ano já passou da conta? O que aconteceu nos últimos 6 meses faz com que 2011 se torne uma forte candidata ao título do “ano que já deu o que tinha que dá”. Vou te dizer viu: se não é o fim dos tempos, é o primeiro bis... não é possível!. Acompanhe comigo os últimos 6 meses: o “derretimento” catastrófico da região serrana do Rio, a terra em transe no Japão, a usina nuclear construída na terra em transe do Japão (não, não foi em Portugal), a chiadeira com o Tiririca na comissão de educação da Câmara (não pode?), o “pinçamento” de Bin Laden no Paquistão, o doente “bulynado” de Realengo, o assalto a mão armada ao código florestal, tucanaram o casamento gay (agora é união homoafetiva...ui!), a morte da Eguinha Pocotó, o dom divino da multiplicação do Palocci, o desapego religioso nas revoltas árabes, o encontro do avião no chão do mar... Ufa! 2012, cadê você?

Mas, a bem da verdade, a despeito da avalanche de fatos que vem nos atropelando, a novidade ao meu olhar ainda é essa tal cinquentona Brasília. Já ouviu falar? Pois é, a nossa tão (mal) falada capital tem cheiro de coisa nova pra esse escritor que vos escreve e, por isso mesmo, vou me dar o direito também de colocar minha colherada nessa cumbuca. Como não? Se já me arrisquei a falar bem e mal do Acre por 7 anos, como agora vou me acovardar com o Planalto Central? De modo algum. E como sempre tive a sorte de gostar dos lugares por onde passei (Brasília não é diferente), além daqui ser a capital do meu país (e por isso quero explicações!), me sinto muito a vontade em futricar por essas bandas.

Com o seu jeito de “maquete em tamanho natural”, Brasília é um paradoxo. Ao mesmo tempo em que não tem nada a ver com o Brasil, ela é cara do país. Construída numa lógica “rodocartesiana” de enxergar a vida, a nossa capital se parece com o Brasil justamente no que tenta negá-lo: as desigualdades escondidas em suas tesourinhas. Brasília é uma cidade que, a quem chega, faz questão de deixar o seu recado: “Assim como o poder, eu sou para poucos, não dou explicações, vim pra cá ganhar dinheiro e fujo nos finais de semana”. Pois é, a considerar que ela é a capital do Brasil, percebê-la de nariz empinado e cheia de não-me-toques, é bastante sintomático e, muitas vezes, antipático.

Com o apartheid de suas linhas e desenhada como um avião, Lucio Costa não planejou (será que não?) o “bagageiro” em que se transformaram as cidades satélites no entorno do Plano Piloto. Grandes “cidades dormitórios”, o cinturão no entorno de Brasília é possível ver algo do irradiamento da riqueza vinda das margens do Paranoá. Mas a sua grande característica ainda é uma ausência crônica do Estado que faz de algumas delas estarem entre as mais violentas do mundo. Isso a 20, 40 quilômetros do Palácio do Planalto.

Mas ao contrário do que vocês devem estar pensando, os brasileiros comuns tem seu playground no Plano Piloto. Tá pensando o quê?! Mas é pra olhar e desocupar rapidinho... como se sabe, não se pode facilitar com esse povo brasileiro. Deixa que eu explico:

Pra quem não conhece Brasília, o cruzamento das asas do avião com o corpo do avião, fica a rodoviária do Plano Piloto. Ali chegam e saem os ônibus que correm todo o Distrito Federal. Ela fica de frente a Esplanada dos Ministérios. Acima da rodoviária é um imenso viaduto, não só de carro, que você acessa por ela. Uma espécie de terraço da Rodoviária. De lá você tem uma vista privilegiada da Esplanada dos Ministérios, com o Congresso Nacional ao fundo. É dali que o povo que vem das cidades esquecidas do entorno de Brasília, tem o contato com o poder em Brasília. É dali, e somente ali, que o desenho de Brasília propicia o acesso ao “brasileiro que anda de ônibus” ao poder em Brasília. É apenas uma vista ao longe, que de tão fria dá a mesma sensação que você tem ai da televisão.

Fico pensando de como era a capital do país no Rio de Janeiro e toda aquela miscelânea de gente, naquele emaranhado do traçado urbano carioca. Apesar de gostar de simetria, ainda vejo mais charme no “compromisso com o caos” das cidades não planejadas, onde as ruas e os becos ainda ganham nome de gente.

Hoje temos uma capital com o “pequeno detalhe” de não entender o país e um país que não se enxerga na sua capital. No entanto, acreditem, Brasília é Brasil. Não tenho dúvidas de que nossa capital é uma grande façanha brasileira, de um tempo em que entendíamos esse imenso continente como “de Osasco pra lá, é tudo Mato Grosso”. Talvez seja isso: de tão impressionante e diferente, nossa capital é um grande avião que decolou... mas não aprendeu a aterrissar.

Felipe Mendonça
Servidor Público e morador do suvaco da Asa